Murilo Portugal deixa FMI e assume nesta quinta a presidência da Febraban
17/03/2011 - Por Bancários CGR
Depois de uma carreira dedicada exclusivamente ao governo e a organismos  multilaterais, o economista e advogado Murilo Portugal assume hoje, aos  62 anos, o seu primeiro cargo na iniciativa privada: presidente da  poderosa Federação Brasileira de Bancos, a Febraban. Sua nova função  inclui falar sobre alguns assuntos espinhosos, como os altos lucros dos  bancos e os salgados juros básicos vigentes no Brasil, que muitos acham  que beneficiam o setor financeiro.
 
 "Os bancos não gostam de juros altos", afirma Portugal, em entrevista ao  Valor. Como qualquer outra empresa, argumenta ele, os bancos querem  manter baixos tantos os custos quantos os preços de seus produtos. Os  bancos pagam juros na maior parte das suas captações e, para eles, juros  básicos mais altos significam custos mais altos. "Preços mais baixos  permitem aos bancos expandir os volumes de crédito e até ganhar mais,  mesmo cobrando menos."
 
 Os bancos voltaram a exibir lucros recordes nos seus balanços, mas  Portugal diz que não há nada de especial nisso. "O ano passado foi muito  bom para a economia, com crescimento de 7,5%, recuperação de consumo e o  setor corporativo como um todo mostrou resultados muito bons", afirma.  "Os bancos também ganham com a expansão da economia, com o aumento de  20% no volume de crédito, queda da inadimplência e aumento do volume de  serviços prestados."
 
 Não foram apenas os bancos que lucraram mais, argumenta. "Só para dar um  exemplo: os lucros da Vale e da Petrobras somados chegam a R$ 65  bilhões", disse. "É quase 50% mais do que a soma dos lucros dos dez  maiores bancos do país, que chegou a R$ 45 bilhões."
 
 Na Febraban, como primeiro administrador profissional, que coloca fim na  tradição de presidentes de grandes bancos se revezarem também no  comando da associação, Portugal diz que uma das suas principais funções  será dialogar internamente com o sistema bancário. "É um sistema  bancário heterogêneo, e sua fortaleza decorre muito do fato de que temos  bancos públicos, estrangeiros e privados nacionais, bancos grandes,  médios e pequenos", afirma ele. "Minha função será ouvir todos os  segmentos e conversar com governo, executivo, legislativo e judiciário."
 
 Na interlocução com o governo, deve ajudar muito a sua larga experiência  desse outro lado do balção. Funcionário de carreira do Ipea, principal  centro de estudos econômicos do governo, Portugal foi secretário do  Tesouro Nacional durante a implantação do Plano Real, ajudando a dar  consistência às contas públicas em um período em que não havia um  aparato institucional como agora, incluindo uma lei de responsabilidade  fiscal.
 
 Entre idas e vindas, Portugal também tem mais de dez anos de experiência  no Fundo Monetário Internacional (FMI). Em 1998, tornou-se o  representante brasileiro no organismo, exatamente quando o país  enfrentava uma grave crise e teve que pedir socorro. Ele voltou ao  Brasil em 2005 para assumir a secretaria-executiva do Ministério da  Fazenda e, no fim de 2006, estava de novo em Washington para assumiu o  terceiro cargo mais importante no FMI. No mesmo período, o Brasil se  tornou credor do organismo.
 
 Mudou muito a imagem do Brasil no FMI de um período para outro? "Claro,  mas o Brasil sempre teve, mesmo no período de crise, um tratamento muito  positivo", afirma. "O FMI nunca impôs nenhuma solução." Exemplo: a  pedido do governo, o FMI aceitou que o Brasil mantivesse seu regime de  câmbio fixo em 1998, embora defendesse maior flexibilidade. "Os  empréstimos ajudaram muito o Brasil naquela época, mas é lógico que é  muito mais agradável e prazeroso um relacionamento com o FMI como o que  temos agora, quando em vez de tomar emprestado estamos emprestando para  eles."
 
 Na sua volta ao FMI, Portugal enfrentou um período de turbulência  global. "O momento mais crítico foi imediatamente após a falência do  Lehman Brothers, em outubro de 2008, onde realmente o pânico e a  desconfiança tomaram conta dos sistemas financeiros", afirma. "Tivemos  relatos de vários países membros onde ocorriam saques elevados em  agências bancárias e houve um travamento completo dos mercados  interbancários."
 
 O FMI, reconhece Portugal, falhou na crise porque, assim como outras  instituições públicas e privadas, não conseguiu alertar suficientemente  para os riscos. Em alguns de seus documentos, como seu relatório de  estabilidade financeira, chegou a fazer menções ao problema das  hipotecas subprime nos EUA e o papel das agências Fannie Mae and Freddie  Mac. "Mas faltou colocar os pingos nos `is` e acho que o FMI já  reconheceu isso, já fez a `mea culpa` e iniciou várias tentativas para  corrigir os problemas", afirma. Hoje, está muito mais preparado.
 
 O combate à crise foi possível graças à colaboração entre os países em  fóruns mundiais como o G-20, mas agora essa coesão está se esvaindo,  agora que parte do mundo volta a crescer de forma mais acelerada. "Isso é  uma coisa natural, nada melhor para concentrar mais a atenção do que o  medo", afirma.
Fonte: Contraf/CUT com Valor Econômico
